Escola de Vela Oceano Florianópolis
O planejamento da
melhor rota
Por Marcelo
Visintainer Lopes
Instrutor de Vela
Escola de Vela
Oceano
Na segunda-feira (21 set) teve início mais
um módulo do curso de vela oceânica - M4 (Personal Sailing).
O curso é realizado em dois dias
consecutivos com pernoite a bordo (20 horas de prática).
Embora eu inicie a avaliação das
condições uma semana antes da saída, a decisão final do destino ocorre minutos
antes da partida, após reunião com os tripulantes.
Minha primeira opção sempre é a volta
da ilha e a segunda é a região de Porto Belo.
Analisando os modelos e levando em
conta os objetivos do curso e também dos contratantes, decidimos velejar para Porto
Belo.
O bacana deste destino é que existem
diversas opções de abrigo pelo caminho.
Ganchos, Zimbros, Ilha do Macuco (Amendoim)
e até mesmo Bombinhas servem de apoio para a travessia.
Com o passar das horas podemos
perceber que nem sempre o plano A será o melhor para encarar as condições impostas
pelo mar e por isto é importante que tenhamos outros pontos de apoio.
Diversas vezes eu transformei o plano
A em outras letras do alfabeto.
A resiliência é uma das bagagens mais
importantes na vida de uma velejador!
É normal que ocorra mudança de plano e
não há nenhum problema em não alcançar o destino planejado.
No caso específico desta velejada de
dois dias, seguir a favor do vento e das ondas foi a nossa opção.
Na ordem das minhas preferências eu prefiro
pegar mar a favor na ida e na volta (nem sempre isto é possível).
Minha segunda preferência é pegar
condição contrária no primeiro dia e favorável no retorno.
A terceira é velejar a favor no
primeiro dia e voltar contra o vento no segundo dia (desde que as condições
sejam mais confortáveis).
Analisando a opção de “volta da ilha”
entendi que a previsão de vento do segundo dia não era favorável para empurrar
o barco pelo lado de fora da ilha, ainda mais com o tamanho de ondulação prevista
(2 a 2,5m).
Para o barco andar para frente com mar
de popa, o vento deve soprar de moderado a forte, pois do contrário as velas
ficam batendo forte de um lado para o outro sem nenhuma pressão e o barco
balança sem parar.
A previsão do primeiro dia era de
ventos de 15 a 21 kt e no segundo o mar e o vento diminuiriam.
Embora o período estivesse bem alto a
ondulação de vento não estava alinhada com o swell primário, produzindo uma
ondinha “atravessada” de meio metro.
A volta (terça) seria de contravento,
mas eu já havia previsto um retorno tranquilo.
Tudo saiu dentro da previsão e a
velejada com o mar mais alinhado foi bem bacana.
Se a previsão estivesse indicando
ventos fortes para a volta, com certeza o nosso planejamento não seria este,
mesmo com apenas um dia de velejada contra.
Falando em travessias prolongadas:
O impacto constante das ondas sacrifica
o casco, a mastreação e também a tripulação.
A adernação do contravento e os
movimentos de subida e queda brusca nas ondas dificultam as atividades
essenciais a bordo e também diminui o número de beliches úteis.
Se o objetivo estiver bem contra o
vento, a velejada envolverá múltiplas cambadas e o tempo de travessia poderá
facilmente dobrar ou triplicar, ainda mais se houver correnteza contrária.
É normal ocorrer também a perda na
qualidade da alimentação, ainda mais se não houver um cozinheiro ninja a bordo.
A tripulação vai se virando com ovos
cozidos, biscoitos, frutas e sanduiches e este tipo de alimento não cumpre as funções
de esquentar o corpo e gerar prazer.
O alimento quente é entendido como uma
recompensa e a sua produção é essencial para manter a moral da tripulação.
Com a ajuda do forno e de uma panela
de pressão, o cozinheiro ninja encara o desafio de cozinhar aos solavancos.
Por estas e por outras é que as
velejadas a favor do vento são mais aconselhadas para quem deseja realizar uma
viagem dos sonhos.
Existem algumas exceções para um
comandante optar por realizar uma travessia contra o vento:
1.
Dias de mar calmo, com vento moderado e constante e com um rumo que leve direto
ou próximo ao destino.
Com estas condições de mar (se a
corrente não for contrária), o barco desenvolverá uma boa velocidade real.
Navegar em um bordo só, direto ao
destino e com o mar nestas condições, pode se transformar na “velejada da
vida”.
Esta é a mais pura verdade,
principalmente no calor do verão.
Neste caso, o vento aparente funciona
como um ventilador ligado, fazendo com que a sensação de calor diminua.
2.
Quando não houver outra opção por causa de agenda...
Data marcada para chegada, tripulantes
com passagem marcada etc.
3.
Locais onde a predominância do vento é sempre contra.
Daí realmente não existe outra
maneira!
Velejar no contravento às vezes não é
tão ruim, mas a ansiedade pode levar o comandante a tomar a decisão errada.
Se der para esperar pela mudança do
vento, espere!
Se der para cancelar a missão,
cancele!
Se não der para esperar, procure
tripulantes que possam ajudar de verdade!
Estude friamente a possibilidade de
enviar o barco de outra maneira.
Lá no sul é muito comum o pessoal optar
pelo transporte de caminhão para não ter que sair pela barra de Rio Grande.
Planejamento e bom senso!
Tem um ditado na vela que diz: é
melhor se arrepender de não ter ido do que se arrepender de estar lá!
A sensação de que “teria sido bom” é
bem melhor do que o arrependimento de estar no lugar errado na hora errada.